sábado, 14 de abril de 2012

Camilo Castelo Branco nas Taipas

Durante o século XIX e até ao início da década de 70 da centúria seguinte, Caldas das Taipas foi um activo centro termal do noroeste de Portugal. As características das suas nascentes termais, as suas óptimas condições naturais e geográficas e a sua oferta hoteleira permitiram que, ligado a uma conjuntura favorável às estâncias termais, se registasse, nesse período, uma elevada afluência de aquistas. Do extenso universo desses aquistas que encontravam, nas Taipas, um ambiente acolhedor e de repouso, decidimos dedicarmos neste artigo, à presença de dois destacados romancistas portugueses: Camilo Castelo Branco e Ferreira de Castro. Embora afastados no tempo, estes vultos da literatura portuguesa constituem duas singulares presenças na história e na memória colectiva desta vila. Camilo Castelo Branco A tradição, a história, a obra e o próprio testemunho de Camilo comprovam-nos que este romancista permaneceu nas Caldas das Taipas por inúmeras ocasiões, como veremos de seguida. No Discurso Preliminar das “Memórias do Cárcere”, Camilo Castelo Branco evoca alguns dos dias em que viveu nas Taipas, enquanto andava perseguido pela justiça por razões amorosas. Ana Augusta Plácido casada com o banqueiro Manuel Pinheiro Alves, envolve-se sentimentalmente a Camilo, chegando em 1859, a fugir definitivamente para os seus braços. Entretanto, o marido de Ana Plácido instaura um processo por crime de adultério, sendo ambos pronunciados. Devido a esta situação, Camilo e Ana Plácido andaram foragidos desde o mês de Maio de 1860, por diversas terras do norte ( Samardã, Vila Real, Guimarães, Taipas, entre outras) até que, cada um por sua vez são presos: primeiro Ana Plácido, a 6 de Junho de 1860 e seguidamente o romancista a 1 de Outubro desse mesmo ano. Com efeito, Camilo permanece na Cadeia da Relação do Porto, até 16 de Outubro do ano seguinte, data em que foram ambos absolvidos. Foi nesta época acidentada e difícil da sua vida, sensivelmente na primeira quinzena de Junho, que Camilo se refugiou nesta povoação termal. Francisco Martins Sarmento, seu amigo, foi quem lhe arranjou alojamento numa casa vizinha da actual pensão Vilas e próxima dos “Banhos Velhos”. Segundo a tradição, Camilo para não ser reconhecido pelos diversos doentes que frequentavam diariamente este estabelecimento termal em plena estação balnear, tomava banho nas águas sulfurosas à noite (OLIVEIRA 1994: 9). Pode-se estranhar o facto de Martins Sarmento não ter instalado o escritor no seu Solar da Ponte, em Briteiros, situado a poucos quilómetros das Taipas, mas segundo o Dr. Santos Simões “as relações entre ambos não tinham ainda o carácter de intimidade que rapidamente alcançaram e o facto de Camilo andar foragido à justiça obrigou a uma situação de compromisso ” (SIMÕES 1990: 16). Camilo refere igualmente nas suas “Memórias do Cárcere” que enquanto se encontrava nas Taipas, dava passeios de barco no rio Ave com Martins Sarmento, apreciava as frescas carvalheiras, frequentando, por vezes, os bailes da Assembleia, apesar do receio de ser reconhecido. Após este período passado nas Taipas, o escritor desloca-se para a Quinta do Ermo (cercanias de Fafe) do seu amigo José Cardoso Vieira de Castro. Tempo depois, Camilo é novamente hóspede de Martins Sarmento, mas agora na sua Quinta da Ponte. Depois desta temporada que permaneceu nas Taipas, fugido dos agentes judiciais, Camilo não deixou de visitar esta povoação. Na correspondência travada com José Vieira de Castro, entre 1870-1872, Camilo refere em muitas dessas cartas que frequentava as Taipas, juntamente com Ana Plácido, em busca de alívio dos sofrimentos que padecia (CORRESPONDÊNCIA 1968). Numa dessas cartas, o escritor afirma que consultou três médicos para tentarem diagnosticar os males que antecederam a sua cegueira, que o conduziriam ao suicídio em 1890: “Antes de ontem reuni aqui três médicos. Não sei o que pensam de mim. O de Braga chama gastralgia à moléstia. O de Guimarães também. E o das Taipas, que cura há 60 anos, ainda não sabe o que é. Eu sei, e louvo a delicadeza de todos” (CORRESPONDÊNCIA 1968: 37). Igualmente na sua correspondência travada com Martins Sarmento encontramos cartas, nas quais nos apercebemos claramente que, na década de 80, Camilo era ainda um assíduo visitante desta estância. A título de exemplo, podemos mencionar o seguinte extracto datado de 23 de Maio de 1881, escrito por Martins Sarmento e dirigido a Camilo: “Eu conto ir para Briteiros no dia 8 de Junho. Se for para as Taipas veremos se é capaz de ir ver as minhas velharias” (CARTAS 1990: 65).

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